A província chinesa de Henan está construindo um sistema de vigilância com tecnologia de escaneamento facial que pode detectar jornalistas e outras “pessoas de interesse”. Documentos obtidos pela BBC News descrevem um sistema que classifica jornalistas na China em um sistema de alerta – verde, amarelo e vermelho.

Dessa forma, profissionais da imprensa com “sinal vermelho” seriam “encaminhados conforme esperado”, dizem os documentos. O Escritório de Segurança Pública de Henan não comentou sobre o assunto. Os documentos foram descobertos pela empresa de análise de vigilância IPVM, e também trazem planos para vigiar outros indivíduos, incluindo estudantes estrangeiros e mulheres migrantes.

Categorizando a imprensa

A organização de direitos humanos Human Rights Watch afirmou estar preocupada. O governo chinês não precisa de mais poder para vigiar as pessoas, especialmente quem pode estar tentando cobrar pacificamente que o governo seja mais responsável, declarou a organização.

Os arquivos, publicados em 29 de julho, fazem parte de um processo de abertura de dados encorajando companhias chinesas a participarem de uma licitação para concluir um novo sistema. A licitação foi vencida em 17 de setembro pela NeuSoft, que também não se manifestou sobre o tema.

A ferramenta inclui tecnologia de reconhecimento facial ligada a milhares de câmeras em Henan e alerta as autoridades quando uma “pessoa de interesse” é localizada. Essas pessoas são categorizadas em “bibliotecas temáticas” em um banco de dados já existente de informações e imagens dos moradores e visitantes da província.

Câmeras de vigilância

Câmeras de vigilância (Imagem: Pexels)

O sistema também se conecta com o banco de dados nacional da China. Um dos grupos de interesse para o Escritório de Segurança Pública de Henan são jornalistas, incluindo correspondentes estrangeiros. Os dados obtidos afirmam que “a proposta preliminar é classificar os principais jornalistas de interesse em três níveis”.

Um alerta seria acionado sempre que houvesse a detecção de um “jornalista de interesse” marcado como vermelho ou amarelo. Esses profissionais era identificados ao reservar uma passagem para viajar pela província, por exemplo.

China também classifica estudantes e mulheres

Um slide do documento descreve como o sistema de vigilância funcionaria com captura de imagem e analisaria ainda estudantes estrangeiros. Esses últimos, aliás, também são divididos em três categorias de risco: “estudantes estrangeiros excelentes, pessoal geral e pessoas-chave ou pessoal instável”.

“A avaliação de segurança é feita com a análise da frequência escolar diária dos estudantes estrangeiros, notas de avaliações, se vêm de países-chave e concordância com a disciplina da escola”, diz o material. As escolas deveriam informar às autoridades estudantes que se revelassem possíveis problemas de segurança – sendo vigiados posteriormente.

Durante períodos politicamente sensíveis, como a reunião anual do Congresso Nacional do Povo, um “mecanismo de alerta de guerra” seria ativado e vigiaria ainda mais estudantes de interesse, contando inclusive com monitoramento de seus celulares.

chineses

Imagem: Nuno Alberto on Unsplash

Os documentos mostram um desejo do sistema em ter informações capturadas de smartphones, redes sociais como WeChat e Weibo, dados de veículos, estadias em hotéis, passagens de viagem, compra de propriedades e fotos.

Ele ainda observaria ainda mulheres abadonadas ou migrantes não-chinesas, sem direito de morar no país. Vale notar que muitas mulheres vão à China para buscar trabalho, enquanto outras são vítimas de tráfico humano de países vizinhos.

Por fim, o sistema se conectaria com o Escritório Nacional de Imigração, o Ministério da Segurança Pública e a polícia de Henan, entre outras organizações. Os documentos foram publicados no momento em que o governo chinês critica a mídia estrangeira por sua cobertura das enchentes de Henan. A cidade Zhengzhou foi devastada após receber o equivalente a um ano de chuvas em apenas três dias.

Vigilância pesada

O diretor de governo do IPVM, Conor Healy afirmou que a arquitetura técnica da vigilância em massa na China ainda é pouco compreendida. No entanto, construir vigilância personalizada para vigiar e suprimir jornalistas com apoio do Estado é certamente algo novo. Os documentos mostram exatamente o que os oficiais de segurança pública da China querem com esse tipo de ferramenta, acredita Healy.

Esse sistema de reconhecimento facial chinês possivelmente já está em uso em todo o país. Em 2020, a Huawei teria testado um software de inteligência artificial capaz de reconhecer pessoas pertencentes à minoria étnica Uighur e alertar a polícia.

A diretora da Human Rights Watch na China, Sophie Richardson, afirmou que o objetivo da vigilância é assustador. Afinal, todos sabem que podem estar sendo monitorados, mas nunca o que podem ter feito para despertar interesse hostil do Estado.

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