Com as plataformas digitais cada vez mais presentes na vida das pessoas, surge a necessidade de adesão aos seus “Termos de Uso”, os quais estabelecem as diretrizes regentes da relação entre as plataformas e seus usuários.

Contudo, não raras as vezes, o usuário clica em “aceito” sem ao menos ter lido uma linha sequer dos tais Termos de Uso, permanecendo sem conhecer os direitos e deveres ali estabelecidos.

Recentemente os usuários da internet se viram impactados por um episódio da série Black Mirror. O episódio “Joan Is Awful” chamou a atenção para os desdobramentos causados na vida da personagem, em razão de um suposto “aceite irrefletido e automático” dos Termos de Uso de um streaming mencionado na série.

(Não) li e aceito. O que é importante saber sobre os Termos de Uso?

Imagem: divulgação/Netflix

O referido episódio começa com um dia qualquer da vida de Joan, que chega em casa para assistir seriados com seu namorado, quando se depara, de repente, com uma série chamada “Joan Is Awful”. Ao assistir o primeiro episódio, ela percebe que a série está retratando sua vida, dramatizando as situações de seu cotidiano com muitos exageros.

Joan, então, vê sua vida sendo exposta em uma sequência de capítulos do referido streaming, os quais a representam como uma “grande vilã” e divulgam detalhes de sua vida íntima.

Indignada, Joan chega a procurar uma advogada para se defender e proibir esse “acesso indesejado” aos detalhes de sua vida. No entanto, a resposta dada também foi totalmente indesejada: por causa dos Termos e Condições de Uso que ela aceitou irrestritamente, a plataforma estaria autorizada a produzir a série. Inclusive, um amigo de Joan chama sua atenção dizendo que sempre a advertiu pela sua postura displicente.

Óbvio que existe um exagero ou uma licença poética na história de “Joan Is Awful”, no entanto, há também um importante alerta: leiam os Termos de Uso!

Justiça

Imagem: Sora Shimazaki/Pexels

Engana-se quem acredita que a Justiça não aceita a validade dos Termos de Uso em meio virtual. Pelo contrário, se o usuário descumprir os termos de uma plataforma, ele estará sujeito ao que ali estiver previsto. O Tribunal de Justiça de São Paulo, por exemplo, reconheceu que a desativação de um usuário é uma pena proporcional, caso haja descumprimento dos Termos de Uso.

Em recente decisão, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal, ao reconhecer a validade da desativação de um usuário por descumprimento dos Termos de Uso, apontou que “nas relações contratuais privadas, prevalecerão o princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual”.

Ou seja, o aceite àqueles Termos de Uso é reconhecido como relação jurídica, em que se estabelecem direitos e deveres para o uso de determinado serviço, geralmente voltadas para o uso daquele aplicativo, tratando-se de um contrato eletrônico e atípico.

Por que todos os usuários deveriam ler os Termos de Uso?

Dentro dos Termos de Uso há informações importantes, tais como a relação contratual estabelecida, os serviços prestados, o uso e o funcionamento dos serviços, a forma de pagamento, a política de cancelamento e reembolso, responsabilidades das partes e os seus limites, disposições estas que transmitem transparência ao usuário em relação ao funcionamento do serviço prestado, bem como as suas obrigações e direitos.

Pode parecer absurdo (como é) assinar um contrato sem ler. Todavia, em se tratando da era online, onde até as ações humanas pretendem ser executadas na velocidade da luz, essa prática tornou-se corriqueira. Quem nunca o fez que atire a primeira pedra. De fato, a velocidade e efemeridade das relações virtuais fazem com que o usuário quase sempre opte pelo caminho mais curto.

Contudo, ao se deparar com os Termos de Uso, o usuário deverá ter em mente que cuida-se de um contrato como qualquer outro, de modo que se faz necessário ler e compreender o que está sendo estipulado, a fim de tomar decisões conscientes e estabelecer relações virtuais mais seguras. E se esse comportamento for adotado por todos os usuários, certamente as relações virtuais serão mais sólidas e confiáveis.

 

Direito ao esquecimento versus desindexação

Isabela Pompilio é responsável pela área de contencioso da unidade de Brasília de TozziniFreire Advogados, com larga experiência em atuação nos Tribunais Superiores. Atua em causas estratégicas há duas décadas e no acompanhamento de teses visando a formação de novos entendimentos jurisprudenciais em direito cível, internacional e digital.

 

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