Quem esteve atenado às tendências tecnológicas nos últimos anos certamente ouviu falar sobre um tal de metaverso. Afinal, a possibilidade de interação que combina o real com o virtual chamou a atenção global e dominou as pautas — de portais noticiosos a mesas de bar.

Acontece que, por tratar-se de uma inovação ainda em desenvolvimento inicial, as principais discussões focaram em conceitos e potenciais que estão relativamente distantes do atual estágio do metaverso.

Sabe-se, por exemplo, que a tecnologia tem a premissa de ser um espaço virtual coletivo oriundo da convergência de realidades física digital e virtual aumentada. E que esse ambiente proporcionará experiências imersivas e contínuas, com foco em relacionamento social, negócios e entretenimento.

Mas embora o conceito pareça estar minimamente claro, diversos questionamentos rondam as mentes dos entusiastas. Metaverso é hype ou é algo sério? Quem vai estar por trás disso? Qual será o foco da tecnologia? Quando ele realmente estará pronto?

Felizmente, todas essas perguntas fizeram parte do bate-papo exclusivo entre blog KaBuM! e Caroline Dalmolin, líder de Parcerias de Reality Labs na Meta para América Latina. E os principais pontos dessa entrevista podem ser conferidos abaixo — sem a necessidade de um óculos VR/AR.

Período embrionário

Assim como tokens não fungíveis (vulgo NFTs) e criptomoedas, o metaverso é julgado sob óticas receosas por parte da indústria. Isso pode ser atribuído a dois fatores — que estão diretamente ligados: desconhecimento e falta de exemplos práticos mais concretos.

Por mais que o conceito do metaverso esteja em evidência há algum tempo, muitos ainda não sabem o que é a tecnologia. Segundo uma pesquisa da NordVPN divulgada no começo deste ano, 55% dos norte-americanos não fazem ideia do que se trata a inovação.

Justiça seja feita, isso não é um impasse exclusivo dos Estados Unidos. Aqui no Brasil, um estudo da startup OnTheGo investigou o grau de conhecimento dos brasileiros sobre o metaverso. O resultado? Apenas 56% estão familiarizados com a tecnologia e somente 60% conseguem descrevê-la como “um mundo virtual gerado por computador onde as pessoas podem socializar, trabalhar e jogar”.

Até mesmo entre o meio gamer — lembrando que o setor é tido como um dos principais impulsionadores da tecnologia — não há uma unanimidade: 36,2% nunca ouviram falar do metaverso, enquanto 80,4% nunca participaram de alguma experiência do tipo, segundo dados da Pesquisa Game Brasil 2022.

Pesquisa Metaverso - PGB 2022

Levantamento da PGB mostra que o metaverso ainda não é totalmente compreendido no meio gamer – Imagem: Divulgação/PGB

“Mas se o metaverso tem rondado as pautas dos mais diversos ambientes, por que ainda existe uma enxurrada de dúvidas?”, podem estar se perguntando alguns. Bem, a resposta dessa pergunta nos leva direto ao segundo ponto: dúvidas e receios por conta de algo que ainda não chegou (efetivamente).

É preciso ter em mente que as atuais discussões são muito mais abstratas que concretas. Isso porque o metaverso ainda está em um estágio embrionário em sua linha do tempo e todo o potencial apresentado será visto somente em um futuro de médio/longo prazo.

Como resultado, há quem encontre-se perdido sobre como tudo funcionará e outros que ainda ficam receosos se esse ambiente virtual realmente vingará.

“O metaverso é o próximo capítulo da internet e se pudéssemos comparar, nós ainda estaríamos vivendo o estágio de ‘conexão discada’ de seu desenvolvimento. O fato de ainda termos muito para construir e desenvolver pode gerar ceticismos nas pessoas de que é algo que não se concretizará. Mas vale ressaltar que algumas dessas tecnologias essenciais para o metaverso já estão disponíveis, entre elas a realidade virtual (VR) e a realidade aumentada (AR)”, destacou Caroline Dalmolin.

Caroline Dalmolin, líder de Parcerias de Reality Labs na Meta para América Latina

Caroline Dalmolin, líder de Parcerias de Reality Labs na Meta para América Latina – Imagem: Vivian Koblinsky

Ou seja, por mais que a construção desse ambiente já esteja a todo vapor, será preciso um pouco de paciência até que tudo esteja dentro dos conformes. E para isso, há um longo caminho pela frente.

Desafios e mais desafios

E nesta longa jornada de progresso, o principal desafio será a concepção do ambiente. É certo que as empresas envolvidas terão seus próprios mundos, espaços e experiências. Mas todos eles estarão presentes no mesmo metaverso, que basicamente será a junção de diversas tecnologias, plataformas e produtos em um único sistema interconectado.

Logo, construir algo único exigirá um trabalho coletivo de diferentes setores: de big techs a usuários comuns.

“O metaverso será uma construção coletiva, ou seja, estamos falando de um processo parecido com a construção da internet, no qual não pertencerá a uma única empresa. E isso só será possível se houver cooperação entre legisladores, acadêmicos,
desenvolvedores, especialistas em diversos setores, empresas e, o mais importante, as pessoas — que irão utilizar essas tecnologias para definir, juntos, as regras desse ambiente digital” explicou a executiva da Meta.

No âmbito de segurança, por exemplo, será preciso estipular como serão as regras aplicadas neste ecossistema — afinal, se a ideia é uma continuidade da vida real no mundo virtual, será preciso definir leis, condutas ou mesmo algum sistema de vigilância para punir infrações dentro do metaverso.

Falando sobre as empresas, a discussão também deve levar em conta a relação entre marcas e usuários, bem como os sistemas de monetização. Sabe-se que as criptomoedas serão um dos pilares fundamentais neste universo, mas urge a necessidade de estudar bem os meios de pagamento, de analisar questões sobre valor agregado e de planejar todo o potencial das experiências que serão criadas.

Metaverso

Mesmo que o metaverso seja um único ambiente, precisará de um esforço coletivo de todos os players envolvidos – Imagem: chayanuphol/Shutterstock

O escalonamento tecnológico também será um grande desafio. Segundo Raja Koduri, vice-presidente sênior e diretor-geral do Accelerated Computing Systems and Graphics Group da Intel, a estimativa é de que o metaverso exigirá mil vezes mais poder computacional do que temos hoje.

Como o ecossistema projeta um ambiente virtual contínuo, com experiências imersivas, gráficos 3D realistas e inúmeras possibilidades de interação, será preciso otimizar as infraestruturas de computação, armazenamento e rede para que o metaverso possa comportar tudo isso.

E claro: estruturas tecnológicas mais robustas também vão necessitar de hardwares de ponta. A boa notícia é que as empresas estão se movimentando para isso. A Meta deve lançar um novo dispositivo de realidade virtual no dia 11 de outubro, com promessas de aprimoramento de “presença social”. A Apple, por sua vez, pode lançar seu óculos de realidade mista (VR/AR) já no ano que vem. Enquanto isso, outras grandes marcas seguem em busca de desenvolver dispositivos voltados para o metaverso.

Outro ponto é que o desenvolvimento de óculos de realidade virtual e realidade aumentada gerará outro desafio: a democratização de acesso. Como é de se imaginar, esses dispositivos não terão preços acessíveis por qualquer usuário.

E aliar inovação de ponta com acessibilidade será uma questão necessária para todos os players do setor.

“Quando o acesso a qualquer coisa depende de um hardware, esse acesso virá com um custo, e, claro, sabemos que qualquer coisa que venha com um custo tornará mais difícil – ou até impeditivo – para que algumas pessoas possam adquirir. Por isso, já estamos colaborando com parceiros em diferentes programas que vão ajudar a democratizar o acesso e também estamos desenvolvendo essas tecnologias de uma forma que haverá muitos pontos de entrada para o metaverso — inclusive através de telefones celulares e dos aplicativos que as pessoas usam hoje em dia”, pontuou Dalmolin.

Mas afinal, quando o metaverso será concretizado?

Parece claro que o metaverso ainda está em estágios iniciais. E que a conclusão desse ecossistema será visto apenas com a construção e organização coletiva dos players deste meio. Mas em tempos de modernidade líquida, a grande questão é se há algum prazo para tudo isso sair do papel e ser incluído, de fato, no cotidiano das pessoas.

Antes da resposta de milhões, vale destacar que já existem experiências no metaverso. Com lançamento mais amplo em dezembro do ano passado, o Horizon Worlds da Meta já permite que minijogos, criações e passeios online sejam experimentados por seus usuários. Enquanto isso, a plataforma Decentraland movimenta milhões de dólares com o comércio de terrenos virtuais. E o AlspaceVR, da Microsoft, já tem sido usado para eventos e até reuniões com advogados.

[Entrevista] 'O metaverso será uma construção coletiva', destaca executiva da Meta
[Entrevista] 'O metaverso será uma construção coletiva', destaca executiva da Meta
[Entrevista] 'O metaverso será uma construção coletiva', destaca executiva da Meta

Mas para os mais ansiosos, a realidade é que o metaverso deve durar “de cinco a dez anos“, segundo Dalmolin. “Ainda há muito o que se avançar no desenvolvimento do metaverso, existem muitas ferramentas e tecnologias que precisarão ser criadas para que seja possível construir essa visão de metaverso”, projetou.

O prazo se alinha às previsões de Ruth Bram, produtora executiva da Meta, e de Richard Kerris, executivo da Nvidia. Ambos parecem reforçar que há um grande caminho pela frente, mas concordam que muitos usuários estarão lá daqui a uma ou meia década.

Fato é que ninguém sabe se este prazo será cumprido à risca — novamente, há muito a ser organizado, desenvolvido e planejado. Mas isso talvez explique o motivo da demora do metaverso “de verdade”, o que, consequentemente, também aumenta as expectativas de uma experiência totalmente imersiva, que navega pelo real e virtual, incorporada no cotidiano dos usuários — conectados.

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