Nem todo herói usa capa: cientistas suíços criam lentes de óculos que nunca embaçam
Estudiosos de Zurique revestiram lentes com partículas de ouro e titânio, permitindo aquecimento pela energia solarBy - Rafael Arbulu, 13 dezembro 2022 às 13:24
A COVID-19 jogou luz sobre um problema que, até então, vinha dormente e apenas uma parcela da população conhecia: lentes embaçadas de óculos, algo que se tornou majoritariamente engrandecido pelo uso de máscaras de proteção facial. De repente, parte do mundo se viu obrigada a escolher uma entre duas opções indigestas: enxergar plenamente e arriscar-se a ser infectado, ou se proteger da doença e perder a visão “full HD” dos olhos.
Provando que o heroísmo vem de vários canais, cientistas do Instituto Federal de Tecnologia de Zurique (ETH), na Suíça, conseguiram criar novas lentes de transição que, de acordo com os testes feitos até agora, praticamente eliminaram esse problema. E o método usado não é nada se não bastante criativo.
Antes de tudo, é preciso entender a dificuldade enfrentada por pelo menos quatro pessoas da equipe do blog KaBuM!: as lentes dos óculos embaçam por causa do calor. Quando você veste uma máscara facial, um dos seus efeitos é jogar o calor da sua respiração para cima, na direção dos olhos. Esse calor, ao entrar em contato com a temperatura mais fria das lentes, é o que causa o seu esmaecimento – ou seja, “embaçadas”.
O problema é que não há muita solução disponível para isso: à parte de tirar o óculos e limpar a lente com algum pano, você não tem mais o que fazer para resolver o problema. E isso é algo apenas temporário, já que “respirar” é algo que você meio que precisa fazer constantemente – com ou sem máscara.
A outra solução seria alterar temperaturas, mas mesmo isso é problemático: é impossível resfriarmos o calor da nossa respiração (para isso, teríamos que baixar o nível de calor do corpo, o que é meio chato para a nossa saúde, já que “tentar não morrer” é meio que o padrão de comportamento da humanidade).
A única opção, então, é aumentar a temperatura média da lente. O que também traz outras dificuldades: você teria que contar com alguma fonte de energia constante, o que exige algum tipo de bateria, que por sua vez altera o formato do óculos, possivelmente deixando-o mais pesado e desconfortável – isso, sem falar no controle do calor gerado: se for pouco, a solução não terá efeito prático; se for muito, então as lentes e a armação terão que ser diferentes, ou ainda há o risco de machucar o usuário.
E é aí que, como diz a expressão, vem o “pulo do gato”: os cientistas do ETH obviamente teriam que contar com as lentes de transição – aquelas que ficam transparentes ou escuras dependendo da iluminação do ambiente – então decidiram brincar com essa parte da tecnologia. Basicamente, eles criaram um revestimento que mistura titânio com partículas de ouro na construção da lente, junto de um capacitor que usa energia solar para se manter ativo.
O ouro é um excelente condutor de calor, enquanto o titânio é um material fantástico para a retenção dele. Aliando ambos ao capacitor, você tem uma lente que é capaz não apenas de absorver altas quantidades de energia solar, mas também de mantê-la armazenada e em funcionamento por mais tempo.
E o melhor: o conjunto todo tem cerca de 10 nanômetros (nm) de tamanho. Para fins de perspectiva, 10 nm é a espessura de alguns processadores mais antigos de computadores.
De acordo com os especialistas, que publicaram o estudo na revista científica Nature, o projeto em si nem é tão caro – as quantidades de ouro necessárias são bastante reduzidas – então existe a aplicabilidade dessa solução em vários outros campos – de lentes de óculos, por exemplo, pode-se pensar em estudos científicos que envolvam o disparos de lasers em superfícies metálicas.
Os cientistas por trás da ideia estimam que, em um óculos, um design desse tipo esquentaria a superfície das lentes em mais ou menos 8ºC. A expiração – o ato de “botar ar pra fora” da respiração – tem em média 34ºC, mas eles asseguram que os oito graus acrescidos da temperatura comum de uma lente são suficientes para impedir que ela fique embaçada.
Obviamente, toda a ideia é, neste momento, um protótipo, e infelizmente não há estimativa de tempo para que ela venha a ser adotada de forma massificada.
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