BIG Festival: aumento de estúdios de games ainda encara pouco incentivo e financiamento
Em um bate-papo com desenvolvedores independentes e com a Abragames no BIG Festival, crescimento de estúdios no setor não necessariamente reflete o sucesso do Brasil com potência na indústriaBy - Luiz Nogueira, 8 julho 2022 às 16:58
Uma pesquisa inédita divulgada pela AbraGames revelou que, nos últimos quatro anos, o Brasil passou de 375 estúdios de games para 1.009. Isso reflete um aumento de 169% em relação a 2018.
Para entender isso e ver como esse movimento se traduz no país, o blog KaBuM! foi ao BIG Festival, o festival de jogos independentes mais importante da América Latina.
Em meio a diversos estandes, há muitos desenvolvedores independentes que aproveitam a oportunidade para divulgar seus projetos para o maior número possível de pessoas.
Desenvolvedores de jogos no BIG Festival
Uma dessas pessoas é Fábio Cacho, diretor criativo do Fogo Games, responsável pelo game “Ghetto Zombies”. Em meio à uma conversa sobre o projeto – que falaremos mais abaixo -, ele contou que, atualmente, ainda há muitas dificuldades para os desenvolvedores brasileiros.
Quando questionado sobre o motivo, Cacho confidencia que, para o estúdio, a grande questão é o orçamento. Como exemplo, ele afirma que a demo que foi mostrada no BIG, com uma pequena parte do jogo, levou mais de um ano para ficar pronta.
Isso porque todos os oito integrantes do time que desenvolve o jogo têm empregos fora do estúdio, já que não possuem um investimento para conseguir focar na produção do título em tempo integral.
“Hoje você não consegue investimento apenas com uma ideia, você precisa de um protótipo. E esse é o maior desafio”, afirma Fábio ainda citando a questão de conseguir tempo para se dedicar ao projeto, se dividindo entre o trabalho e o estúdio.
Além disso, há uma questão ainda maior, já que, para apresentar uma ideia com o intuito de conseguir investimento, o Fogo Games teve de aplicar dinheiro do próprio bolso para realizar algumas partes do projeto.
“Tivemos de contratar algumas artes adicionais, como para a capa. Então tem coisas adicionais que vão além da equipe do estúdio. O logo do jogo também foi encomendado”, comenta.
No entanto – e isso falando da percepção que tive falando com ele -, foi possível ver que, mesmo com a dificuldade, Fábio falava do projeto com bastante entusiasmo, por acreditar no potencial do título.
Segundo ele, a ideia agora é lançar “Ghetto Zombies” completo, mas reitera que tudo depende de investimento, já que, por enquanto, eles possuem uma demo que consegue passar bem a ideia do que planejam.
Concordando com o que Fábio disse, Henrique Hoffman Câmara, programador da Estarta Studio, responsáveis pelo game “Sasá: O Perigo Tem Microfone“, relata que a maior dificuldade é a questão do incentivo.
“Ainda é um mercado muito novo ser um desenvolvedor no Brasil. Não tem muito incentivo, apesar de que está começando a surgir incentivos governamentais e algumas iniciativas privadas. Mas é um mercado que tá começando agora”, revela.
“A gente conseguiu um incentivo do Fundo de Apoio à Cultura, mas as vagas eram poucas e o pagamento era muito dividido entre as outras categorias do mesmo investimento. Acaba sendo essa a nossa principal dificuldade. Mas além disso, é difícil montar time, encontrar uma galera que é dedicada e que consegue fazer esse trabalho legal. Fora que não é uma área ainda muito respeitada no Brasil, infelizmente”, completa.
Porém, felizmente, ele vê uma mudança nessa questão, principalmente com a movimentação recente da indústria. “A gente tá trabalhando para mudar isso, criando novas experiências. Esses eventos, como o BIG Festival e a BGS, também ajudam demais”, finaliza.
Com uma proposta de jogo diferente, o Dragon Fruit Studio, que tem por trás dois estudantes de ciência da computação, Michel e André, lançaram “Neon Depth” para o Setembro Amarelo do ano passado.
Falando sobre as dificuldades, ambos concordam que a maior questão é não conseguir viver disso por aqui. “Para isso [viver como desenvolvedor], é necessário ter um jogo que dê muito certo, o que obviamente é bem difícil. Mas além disso há o marketing. Isso porque, primeiramente, é uma área que a gente não domina e, como somos só nós dois, às vezes não temos tempo de fazer o marketing e desenvolvê-lo. São muitas tarefas para um grupo pequeno”, confidenciam.
“Dependendo do projeto, definir um escopo também é complicado. Conforme se cria um projeto, às vezes acontece da ideia ir aumentando até um ponto que não chega em lugar nenhum. Em um jogo, sempre é possível achar coisas para se fazer. Você tem que definir uma hora de parar. Finalizar o produto e partir para o próximo”, dizem Michel e André.
Visão da AbraGames sobre os desenvolvedores de jogos brasileiros
Ninguém melhor para falar sobre o mercado que justamente a Associação Brasileira dos Desenvolvedores de Jogos Digitais, a AbraGames. Para isso, entrevistamos Eliana Russi, diretora da Abragames e gerente do Projeto Brazil Games, que nos contou que a pesquisa citada lá no começo mostra um cenário interessante, mas que o número de estúdios brasileiros pode ser um pouco diferente.
“Esse número pode ser ainda maior. O número de respostas do formulário foi bem baixo e, por isso, pode ser que o número seja maior”, diz Eliana.
No entanto, ela comenta que isso não pode ser considerado um “boom” de surgimento de desenvolvedoras, principalmente porque não há um levantamento do tipo desde 2018 e, portanto, “pode ser que esse crescimento esteja acontecendo paulatinamente”.
“Mas, para nós, foi uma surpresa maravilhosa, porque a gente saiu de um universo de aproximadamente 400 estúdios para mais de mil. Uma quantidade suficiente para ter escala, para a gente ser indústria”, comenta sobre os resultados.
A ideia é que, agora, a pesquisa seja feita anualmente para identificar como ocorre esse crescimento nos próximos anos.
Como apontado por alguns desenvolvedores, a falta de profissionais qualificados é uma das principais dificuldades por aqui. No entanto, para ela, o Brasil não é o único país a sofrer com a falta de profissionais de nível sênior para produção de jogos.
“No mundo todo, com a indústria crescendo constantemente, não é possível recolocar o mesmo número de profissionais necessários. Se estamos colocando, estamos colocando profissionais júnior. Então, tem uma fase de crescimento e aprendizado”, revela.
“A gente perdeu bastante gente, principalmente na pandemia, com o fim das ‘fronteiras’ geográficas. Você não precisa mais sair do Brasil para trabalhar em Israel ou Nova York. Isso foi extremamente bem aceito pela nossa indústria”, comenta Eliana.
Mesmo assim, para ela, isso não é uma crítica ao que está acontecendo no mundo todo. “Tem o ônus e o bônus. No geral, isso que aconteceu é muito positivo, porque a gente tá cada vez mais integrado com o resto do mundo. E é uma indústria que não sobrevive isoladamente. É uma rede de interconexões”, finaliza.
AbraGames e as dificuldades dos desenvolvedores
A AbraGames tem uma visão bastante ampla das dificuldades dos desenvolvedores brasileiros. Durante a conversa no BIG Festival, Eliana falou que tudo depende do nível do desenvolvedor. É isso que vai pautar os problemas que serão enfrentados no futuro.
“Se você já é um desenvolvedor que tem uma equipe consolidada, que já virou empresa, vem a parte do financiamento, que não existe no Brasil. Normalmente, a gente chama de familiares e amigos, que são os investidores. É uma fase bastante difícil não só para empresas de games, mas para qualquer startup sobreviver nesses primeiros anos”, diz.
Mesmo assim, Eliana é firme em dizer que, para o futuro, a AbraGames quer que o Brasil tenha os mesmos incentivos encontrados atualmente na França, no Canadá e Finlândia, que são políticas públicas, como benefícios fiscais, diminuição de impostos e outras vantagens oferecidas aos desenvolvedores.
Jogos dos estúdios entrevistados
Ghetto Zombies
“Ghetto Zombies” é um shooter 2D em pixel art, que se passa em uma quebrada fictícia. No game, você deve controlar um dos heróis do Esquadrão Ghetto Z, derrotar hordas de zumbis e desvendar a origem do apocalipse zumbi. O jogo base estará disponível para PC, podendo expandir para consoles de acordo com a arrecadação do Catarse.
Sasá: O Perigo Tem Microfone
Sasá, a apresentadora infantil mais querida da TV tem seu assistente de palco Silveirinha sequestrado! Saia descendo o sarrafo nos sequestradores com a cobertura jornalística de Vic Pereira nesse Beat’em up 2D. O título já conta com uma demo jogável em seu site oficial.
Neon Depth
Neste jogo de plataforma com quebra-cabeças, você deve errar, para progredir. Ao falhar, posicione blocos e molde o nível a seu favor.Descubra como usar blocos com diferentes efeitos, para escapar de dentro de si mesmo, enquanto aprende a conviver com seus erros. O jogo está disponível na Steam.
Comentários