Quando se fala em experiência interativa musical, a primeira coisa que alguém pode pensar é em jogos de ritmo. Mas e se o game for focado em narrativa e, ao invés de acertar comandos no tempo certo, seu principal objetivo seja voltado a tomar decisões importantes em um curto espaço de tempo? É exatamente disso que se trata Stray Gods: The Roleplaying Musical.

Desenvolvido pelo Summerfall Studios e distribuído pela Humble Games, Stray Gods: The Roleplaying Musical é uma aventura interativa do gênero visual novel, em que o jogador precisa desvendar o mistério de um assassinato enquanto lida com a presença de deuses da Grécia antiga e vive romances impossíveis. Como o título sugere, o game é embalado por músicas e as utiliza para desenrolar a narrativa.

Tragédia Grega

A história de Stray Gods: The Roleplaying Musical é a seguinte: a protagonista Grace é uma jovem que acabou largando a faculdade porque não consegue se identificar com a área que estava estudando. Enquanto reflete sobre suas escolhas, seu futuro e seu potencial, ela conhece Calliope. As duas rapidamente se conectam através de uma canção compartilhada e parecem encantadas uma com a outra.

Mais tarde no mesmo dia, após Grace chegar em seu apartamento, ela recebe a visita de uma Calliope a beira da morte. Ela não consegue salvar a misteriosa mulher a tempo, mas recebe dela um orbe dourado — sua essência. Logo em seguida, um jovem que diz se chamar Hermes aparece e diz que vai cuidar de tudo, orientando a protagonista a seguir por um portal mágico.

Do outro lado, ela conhece Athena, Persephone, Apollo e Aphrodite, quatro deuses (aqui, chamados de Idols) que formam um grupo intitulado Chorus. Eles mantêm a ordem entre as entidades gregas enquanto protegem sua própria espécie do mundo dos mortais. Grace é então acusada de assassinar Calliope, e usurpar sua posição como a última Musa. Porém, a protagonista protesta e consegue sete dias para provar sua inocência.

Stray Gods: The Roleplaying Musical

Imagem: Humble Games/Reprodução

Os eventos descritos acima se desenrolam durante os quinze minutos iniciais do game e, honestamente, foi difícil desgrudar o olho da tela, tamanha era a minha curiosidade sobre o que aconteceria em seguida. Entretanto, ainda que Stray Gods: The Roleplaying Musical seja uma experiência narrativa (muito envolvente, por sinal), quem decide o curso da história é o jogador.

Dando personalidade às músicas

A jogabilidade de Stray Gods: The Roleplaying Musical é simples. O jogador precisa apenas ler — afinal, trata-se de uma visual novel —, prestar atenção aos detalhes e fazer escolhas durante os diálogos. Todas as alternativas possuem ramificações e claro, levam a caminhos diferentes. Isso significa que toda ação tem uma reação, e existem muitos finais para a história de Grace.

Stray Gods: The Roleplaying Musical

Imagem: Humble Games/Reprodução

No início, você deve escolher um traço de personalidade para a protagonista: simpática (representada pela cor verde), agressiva (vermelho) e esperta (azul). Algumas opções que aparecem durante os diálogos são reflexos dessa escolha, mas isso não significa que Grace vai agir sempre da mesma forma. Na realidade, mesmo que você escolha o caminho azul (esperta), por exemplo, algumas vezes será necessário dar uma resposta vermelha (agressiva) para conseguir arrancar informações dos personagens.

Afinal, a trama de Stray Gods: The Roleplaying Musical gira em torno de um assassinato e, para provar sua inocência, a protagonista precisa investigar o que levou Calliope a morrer de uma forma tão trágica. Quanto mais perguntas você fizer, mais informações consegue. E como Grace consegue arrancar as verdades de seus principais suspeitos? Inspirando-os a cantar como uma verdadeira Musa.

Música para os ouvidos

O aspecto musical de Stray Gods: The Roleplaying Musical foi o que mais fisgou. Como fã de musicais, as performances e cantorias estão entre alguns de meus momentos favoritos do game. Mesmo que às vezes a canção pareça um pouco fora de sincronia ou a melodia pouco tenha relação com os acontecimentos, isso é explicado pela própria narrativa logo de início: Grace usa sua inspiração de Musa para fazer os outros cantarem.

[Review] Stray Gods: The Roleplaying Musical tem personalidade e reflexões legítimas
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É durante os atos musicais que os personagens expressam seus sentimentos e pensamentos sobre a situação ou sobre alguém, e nem sempre essas verdades fazem sentido, tampouco estão em sincronia com o mundo exterior. Essa reflexão me deixou bastante pensativa durante algumas performances em que a melodia não era exatamente agradável, mas, bem… Nem sempre precisam ser mesmo.

Além disso, as músicas podem ganhar ritmos e letras diferentes, pois as escolhas que verdadeiramente importam são feitas durante esses eventos. Ao longo das canções, Grace precisa decidir em que direção quer conduzir a performance, e as opções possuem cores que refletem seus traços de personalidade. Escolhendo o caminho verde, por exemplo, a melodia fica mais serena, enquanto o caminho vermelho torna o ato mais pesado.

Stray Gods: The Roleplaying Musical

Imagem: Humble Games/Reprodução

Por sinal, as escolhas feitas durante as músicas têm um tempo limite, mas felizmente é possível pausar a performance para pensar melhor. Ainda assim, o caminho que você conduz a performance afeta bastante a trajetória de Grace e pode auxiliá-la ou prejudicá-la na hora do julgamento. Isso também se aplica às opções de romance, que são muitas, afetando a vida amorosa da protagonista e com quem ela pode terminar junto — ou não.

Artístico e com ótimas atuações

Além de performances convincentes e diálogos repletos de ramificações e consequências, Stray Gods: The Roleplaying Musical também oferece uma arte belíssima. Como em qualquer visual novel, as cenas são reproduzidas por meio de imagens estáticas, mas aqui, os personagens contam com diversas expressões faciais, gestos e movimentam-se pelo cenário com frequência.

Devido a isso, o jogo é muito expressivo, mesmo sendo reproduzido por meio de imagens estáticas. Outro aspecto que ajuda muito o game é a atuação dos dubladores. Você ouve constantemente as reações de surpresa, aflição, medo, felicidade e muitas outras demonstrações que deixam Stray Gods: The Roleplaying Musical ainda mais vivo.

Stray Gods: The Roleplaying Musical

Imagem: Humble Games/Reprodução

Também pudera, o elenco de dubladores está recheado de talentos conhecidos: Troy Baker (o Joel de The Last of Us), Laura Bailey (a Nadine de Uncharted: The Lost Legacy), Ashley Johnson (a Ellie de The Last of Us), Mary Elizabeth McGlynn (cantora de Silent Hill e a Alex Wesker de Resident Evil: Revelations 2), Felicia Day (da série The Guild), e muitos outros nomes de peso.

Stray Gods: The Roleplaying Musical vale a pena?

Vale muito a pena. Seja você um entusiasta do gênero visual novel, de musicais, de diálogos com consequências, de múltiplos finais, do trabalho exemplar do elenco de dubladores, ou até mesmo se apenas quiser curtir um game de curta duração (cerca de 6 horas) com muitas reflexões pertinentes, que transborda sentimentos e expressa a arte pura de uma forma original e intrigante.

Por fim, a cereja do bolo para mim é que os desenvolvedores afirmaram que Stray Gods: The Roleplaying Musical é muito inspirado no premiado episódio “Once More, With Feeling” de Buffy: A Caça-Vampiros (via GamesHub) — minha série favorita. No início da jornada, senti que existiam muitas referências ao ato musical da produção televisiva, mas isso se reflete até mesmo em algumas escolhas narrativas que o game toma adiante.

Talvez o único ponto realmente baixo de Stray Gods: The Roleplaying Musical é que não há suporte ao português brasileiro. O jogo conta com dublagem apenas em inglês — o que é compreensível, visto o elenco de dublagem excepcional —, mas existem legendas em alguns idiomas. Infelizmente, o Brasil foi deixado de fora dessa, o que torna o game muito inacessível para quem não tem conhecimento da língua inglesa.

Stray Gods: The Roleplaying Musical está disponível para PC (via Steam), Xbox One, PlayStation 4, Nintendo Switch, Xbox Series X|S e PlayStation 5. O jogo foi analisado no console da Nintendo por meio de uma cópia cedida pela Humble Games.

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