Crítica | ‘Filho da Mãe’ é a melhor despedida que Paulo Gustavo poderia nos dar
Morto em 2021 pela COVID-19, ator e comediante produziu "Filho da Mãe" em homenagem à própria, e agora filme estreia pelo Prime VideoBy - Rafael Arbulu, 7 dezembro 2022 às 16:08
“Por causa de um atraso, o Paulo Gustavo fez todo mundo descer e começou a fazer um standup [sic] para os convidados, enquanto aguardavam a hora de uma apresentação”. Foi assim que Malu Miranda, head da Amazon Prime Video para conteúdo original, definiu a vontade que o ator, comediante, roteirista e diretor Paulo Gustavo tinha de fazer um trabalho dar certo a qualquer custo. E poucas obras contemporâneas exemplificam isso tão bem quanto Filho da Mãe.
Não, não é o xingamento com o qual estamos acostumados, mas sim o título de um documentário feito com filmagens capturadas pelo próprio Paulo Gustavo em homenagem à sua mãe, Déa Lopes, e dirigido por Susana Garcia, também atriz, também comediante e amiga muito próxima do ator, que infelizmente morreu em maio de 2021, decorrente de complicações pela infecção da COVID-19, no ponto mais crítico da pandemia. O blog KaBuM! participou de uma coletiva de divulgação da obra e teve a oportunidade de ver o filme antes dele estrear na plataforma de streaming, marcada para este mês.
Para começar, é importante ressaltar: é comum vermos – seja por recortes no TikTok ou reapresentações completas de seus trabalhos nos cinemas ou nos canais a cabo – como Paulo Gustavo assume um protagonismo quase que natural por onde passa. Espalhafatoso, altivo e sorridente, é muito fácil atribuirmos a ele a “liderança” de uma cena, simplesmente por ele passar essa impressão de “cheguei”.
O documentário segue no rumo contrário disso: Filho da Mãe é uma produção que se preocupa muito em colocá-lo em segundo plano, deixando a mãe do ator – que já serviu de inspiração para a igualmente icônica trilogia Minha Mãe É Uma Peça – à frente e ao centro dos holofotes. Ao mesmo tempo, contudo, ele aparece em grande evidência, cortesia de vários testemunhos coletados após sua morte.
Todo o filme tem por pano de fundo um musical que Paulo e Déa vinham trabalhando juntos – o último espetáculo dele antes da doença – além de mostrar depoimentos e histórias de bastidores contadas por amigos. Mas ao contrário das outras partes da carreira do ator, esse documentário não tem a intenção de ser engraçado. Obviamente, umas boas risadas lhe aguardam – cortesia dessas memórias de seus entes mais queridos – mas esta não é uma obra de comédia.
Aqui, vemos como sua mãe foi uma parte central em sua vida, muito mais do que se imaginava com base apenas no que o ator contava. Déa Lopes está em todas as interações – seja literalmente, como vítima das “provocações” idealizadas pelo filho (e um dedinho de participação do marido, o médico Thales Bretas), seja figurativamente, com o nome dela sendo citado em peripécias e envolvimentos na carreira dele. O trabalho de Susana Garcia no comando dessa produção foi bastante detalhista, o que resultou em algo digno de uma homenagem ao amigo, mas sem faltar com o respeito ao desejo dele de homenagear a própria mãe.
É nisso que reside o principal trunfo do documentário: é fácil para um telespectador entender Paulo Gustavo como “o comediante”. Mais difícil é perceber como essa graça vem de família. A todo instante, ele busca envolver a mãe em todos os processos – desde as piadas até os bastidores de seus trabalhos – e ela responde à altura, participando e incentivando-o a continuar. É uma química digna de artistas que contracenam há muito tempo juntos. Ou – por que não dizê-lo? – uma química de mãe e filho.
São poucos os documentários que conseguem manter um ritmo dinâmico constante – o gênero em si já torna as coisas mais difíceis de serem trabalhadas por não haver o romantismo de uma cena atuada na ficção, mas sim elementos da vida real e bastidores. É bem comum que muitos exemplos caiam em momentos maçantes e projetem uma curva para se recuperar.
Filho da Mãe não é assim: existe uma flexibilização entre a brincadeira e o tom mais sério do trabalho desenvolvido por “Dona Déa” junto de seu filho – querendo ou não, eles estavam juntos em um musical em plena turnê – mas todo momento de tensão conta com uma “entrada” dele, dela ou de ambos, a fim de quebrar o gelo e tornar as coisas mais toleráveis. Quem assiste o documentário percebe isso logo nos primeiros minutos.
Ao final de tudo, o filme mostra como a vida de todos os envolvidos segue em frente com sorrisos. Ninguém esquece que Paulo Gustavo os deixou de forma prematura, mas todos fazem questão de entender que, depois de sua partida, Filho da Mãe parece ser o fim de um longo agradecimento de um filho para uma mãe. Como um show que acaba de fechar suas cortinas após um artista se curvar perante o público que o aplaude.
E verdade seja dita, melhor fechamento que esse, não há.
O documentário tem estreia marcada para o dia 16 de dezembro, exclusivamente no Amazon Prime Video.
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